Pão e Circo: futebol, novela e sertanejo?


  Antes de mais nada, devo me desculpar aos meus leitores pelo longo período que passei sem postar textos novos. E hoje, estou tentando voltar a produzir algum pensamento e compartilhar com aqueles que me acompanham. Esse tema se mostrou interessante para o atual cenário que estamos vivenciando no país, portanto se destacou entre as sugestões que os leitores me enviam.
  Tal como é estruturada a pergunta, ela remonta a um período de muita riqueza do Império Romano, que juntamente com a aristocracia lapida uma abordagem política extremamente focada no entretenimento principalmente da plebe. Existem diversas estruturas para eventos que são deste período, sendo a mais famosa o Coliseu. Indo mais adiante, mas não tanto já que minhas leituras a respeito são extremamente limitadas, diz-se que se trata de uma estratégia de manobrar as pessoas, tais como cidadãos. Ou seja, foi um plano visando manter a ordem e soberania do Império, afim de evitar potenciais revoltas populares.
  Futebol, novela e sertanejo? O que isso tem a ver com esse método de governo? Talvez sejam exemplificações de uma cultura popular como sendo a peça chave para essa abordagem? Não sei com exatidão pois a questão não veio de mim...mas, posso dizer com certeza que o sertanejo não é (até onde eu saiba não) um item, desse conceito geral de cultura de massa, que esteve relacionado a política de forma semelhante à pratica do Pão e Circo. Quanto ao futebol, a literatura revelando escândalos é razoável, embora eu tenha apenas lido um livro a respeito: “Glória roubada: o outro lado das copas”.
  Este livro, escrito por Edgardo Martolio, traz de uma perspectiva muito interessante a maneira como alguns ditadores das últimas décadas têm usado dessa abundância do esporte em tudo, mas mais especialmente na circulação financeira que ocorre. Ele traz vários exemplos, citando até ditadores conhecidos como Mussolini, Pinochet, Hitler; e evidentemente a forma como usaram do artificio da “cegueira passional” causada pelas copas do mundo. Eu poderia exemplificar aqui, e até conseguir fazer um comentário ou outro mais bem-sucedido e com boa profundidade, mas não quero já que o livro falando sobre existe, foi citado e é de alcance de qualquer um com acesso a internet.
  As novelas, por sua vez são mais conhecidas por realizarem esse papel de manipulação, principalmente aqui no Brasil durante as décadas de 70,80,90. É óbvio... já que naquele momento o país passava por uma ditadura militar e queria justamente evitar as revoltas. Foi o momento de ascensão das novelas brasileiras (e creio que as mexicanas passaram por uma situação semelhante, mas precisaria ler mais para afirmar isso) que auxiliaram, juntamente com a propaganda política (muito frequente em regimes autoritários). Isto ressalta o tamanho do investimento nos setores de comunicação como estratégia necessária para a permanência desta forma de governo.
  Como não posso trazer qualquer apontamento acerca da música sertaneja, a análise da pergunta termina aqui. Devemos agora, partir para nuances em comum entre estas formas de divertimento, além do fato de serem definidas meramente como “cultura de massa”.
  Existe um aspecto interessante aqui, que por mais que seja óbvio em sua superfície, estabelece extensões extremamente complexas. Falo da ideia da irracionalidade diante de uma paixão, diante de um aumento de potência emocional não-racional. Mas...por que isso é tão complexo? Pelo seguinte... a partir do momento que existe um ápice de potência, é inevitável a sua queda.
 Aqui, temos uma divergência de ideias interessante e que conta com certo aspecto temporal para definir qual será o cenário. Em qualquer uma delas em que o responsável pela elevação de potência reapareça após a queda, há uma futura angústia irremissível.
 Isto se dá pela forma como a psique humana é. Existe clara dependência do aumento de excitação psíquica a cada ciclo para que o prazer seja assim atingido de maneira desejada. Aqui é onde temos uma indução menos óbvia e exponencialmente mais complexa. Alguns caracterizam assim o conceito de esperança, já que existe um adiantamento mental futuro do que ainda não é real e que provavelmente não será da maneira desejada e idealizada. Desenvolvendo esta ideia para o plano da questão tratada, temos que os líderes políticos que usam da artimanha da elevação psíquica passional objetivando distorcer o plano racional, e assim conduzir as massas consumidores destes conteúdos; estes estão a mercê de uma implicação quase que inteiramente temporal.
  Esta implicação, se trata do decréscimo da potência associado a impossibilidade de sua subida, resultando em um estado de angústia de imediato e que varia de duração dependendo da sua força. Os políticos que assim usam, se estão em uma posição ainda de liderança quando isso ocorre, geram uma insatisfação generalizada. Entretanto, se já tiverem saído desta posição, mantêm consigo esta imagem popular.
  Vale ainda enfatizar que a cada ciclo político completo, me parece ainda que estes padrões libidinais são diminuídos em certa medida, já que a alteração quando não for muito brusca é rapidamente aderida. Me parece que quando um ciclo político usa disso (parece que todos usam, já que é assim que se ganha eleições) seguido de outro diferente que já usava, estas expectativas se chocam com a diferença de produto final entregue, e se o choque não for demasiado forte, há um reajuste a partir da segunda recepção desta dose cultural, já que corresponde a um avanço em relação a primeira.
  Querem um exemplo de políticos que passaram tanto tempo usando desse recurso e acabaram não conseguindo cumprir a este aumento? Bom... basta olhar a história dos últimos anos da nossa política, que passou pelo tal processo de angústia em 2016. A angústia de 2016 foi muito caracterizada pelo cenário econômico que passamos e continua ainda nos dias de hoje, mas esta esperança inatingível não deixa de potencializar a situação.
  Portanto, esta ideia de usar da cultura popular para vestir uma marionete nos grupos sociais consumidores e os movimentar à vontade, é sim muito usada e já provou que é eficiente. Mas, este princípio de prazer quando associado à política pode trazer ideias mais profundas como da angústia/frustração associadas essencialmente em uma dimensão temporal, que por sua vez pode ser cronológica ou psicológica, dependendo do impacto psíquico causado no momento de ápice e redução erótica.  


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