Ideias sobre solidão


Mais uma abstração, mais um tema complexo para escrever. Pretendo nesse texto desenvolver algumas ideias que norteiam o tema da solidão, apontada por muitos como sendo algo pertencente as suas vidas. Esse é um tema bastante comentado no universo intelectual e sempre teve os que diziam que era favorável ou desfavorável à criação de conteúdo. Inicialmente podemos começar refletindo por esse ponto de vista para que então possamos trazer as perspectivas sociais, conforme cabe melhor nessa época em que vivemos.
  A criação de conteúdo aqui cabe um apontamento muito dado e de certa forma quase que popular de que quem é mais solitário observa melhor as coisas, e assim vê coisas que os outros não veem. Esta é o primeiro e mais conhecido pensamento a respeito, mas existe o de que diz o contrário; afinal, quem está vendo uma caixa estando fora dela sempre perde o campo de visão de parte do seu interior em detrimento de uma visão externa inacessível para quem olha de dentro. Então, me parece que existe uma questão interessante; pois se nos voltarmos para a observação afastada do objeto, ela será tanto mais eficaz quanto a distância do observador em relação ao objeto analisado, como diz Bourdieu. Mas, há aqui uma outra perspectiva interessante, a de que quando se está dentro do círculo, se observa mais proximamente nuances daquele comportamento.
  A observação como sendo o ponto mais importante da criação, se torna inevitavelmente a variável mais importante no processo, tendo assim notável relevância no aprofundamento do tema. Aqui, temos uma diferença que cabe a cada humano julgar como sendo a melhor para a produção intelectual devido aos diferentes tipos de pensamentos que podemos ter. Existem vários, mas os que mais me interessam aqui são o indutivo e dedutivo. Pensamentos indutivos e dedutivos são opostos, já que o primeiro parte de pequenos detalhes e expande para o todo, e o segundo já parte do todo para assim focalizar nas minúcias que estão nele.
  Como temos várias formas de pensamentos e somos mais fortes em algumas que em outras, somos fadados a esta relativização de que depende meramente de suas aptidões mais potentes. Alguém com maior potência de pensamento dedutivo, observando de longe consegue captar os detalhes; o oposto é verdadeiro para um sujeito mais forte no indutivo. Logo, do ponto de vista intelectual não há uma relação certeira para seres pensantes, de fora ou de dentro da caixa, de que se sobressairão por sua perspectiva de observador como sendo superior. A criação depende meramente da magnitude do pensamento e do ajuste correto em relação ao objeto, portanto, a solidão não necessariamente traz frutos intelectuais de todos que a vivem, somente daqueles cujo pensamento mais potente seja o dedutivo.
  Agora, a solidão tomada do ponto de vista social traz algumas ideias mais difíceis de serem abordadas. Primeiro de tudo, devemos observar certo caráter “neotribal” (este termo técnico sociológico não me agrada muito por mesmo que seja relativamente novo, se trata de um anacronismo) já que pessoas solitárias em algum grau assim são por não se encaixarem com os grupos que as rodeiam, ficam excluídas por serem diferentes. Isso é óbvio em certa medida, e não muito difícil de se comprovar, já que basta tentar se fundir a um grupo que não se identifique e assim perceberá a resistência dos integrantes em relação a sua entrada (mesmo que ela não seja proposital). Então, de inicio da nossa analise social da solidão, traria este ponto...
  Passando adiante, temos a diminuição do contato social pelo avanço da tecnologia, tornando as pessoas mais solitárias pela própria questão da necessidade. Já que as pessoas precisam interagir menos pessoalmente, a tendência é de que isso vá diminuindo conforme progredirmos na área tecnológica. Aqui por certo narcisismo e vestígio de um complexo de Deus (que todos temos em certo nível... sem se romantizar como sendo perfeito só porque faz uma oraçãozinha e ajuda uma pessoa ou outra), recorrendo cada vez mais às interações em momentos de falta de potência somente, acresce ainda que a discordância deste ponto revela arrogância como proteção de sua auto idealização que seria atacada com a ideia de que perde potência em algum momento.  
  O desenvolvimento tecnológico, portanto, acentua o processo de afastamento dos indivíduos, tornando-os cada vez mais sozinhos, e por definição solitários em algum grau. Então, vivenciamos uma solidão generalizada, que vem com mais força aos indivíduos que não se adequam aos grupos que o rodeiam, sendo estas “panelas” meramente superficiais em certo nível pois se pudéssemos não falaríamos com ninguém para alimentarmos inconscientemente a nossa ideia de nós mesmos. Ainda temos o ponto inicial de que não necessariamente isto fará com que a produção intelectual seja maior dos solitários pois dependem também de outros fatores como as características cognitivas do indivíduo e como ele as utiliza.
  A ideia de melancolia relacionada com a solidão me parece já ter sido implicitamente abordada no texto, mas cabe o apontamento aqui ainda. Esta relação me parece ser uma manifestação do neotribalismo mencionado, já que tendemos a buscar os nossos grupos quando a nossa potência é menor e precisamos deles para reerguer. Como a subida não é realizada, há o despertar do que é chamado pelo Freud do processo melancólico. Este, começa com a inferiorização do Ego seguida de autodepreciação em relação à crítica dos outros, manifestando sua dimensão narcisista que o une ao objeto. Com a queda de potência (inferiorização) temos a busca por subi-la, mas quando não acontece isso há a exposição de si à crítica dos outros do gupo que impediu o aumento de potência, e então o processo melancólico se instala e cresce a medida que é repetido. Aqui, temos que a não-subida da potência é o causador da melancolia deste grupo mais solitário e afetado pela exclusão dos grupos em sua volta.

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